Estado de Minas: TWITTER - A 140 caracteres por segundo

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Matéria publicada no dia 11 de março, quinta-feira, no caderno Informática do Jornal Estado de Minas, em reportagem de Luciane Evans.

Projeto de publicar obra de Cervantes mostra que a literatura invadiu de vez a rede social, com milhares de participantes
Luciane Evans

Fernando Pessoa, que segue Clarice Lispector, que é seguida por Carlos Drummond, que tem seus textos “retuitados” por um estudante, que é um dos 200 mil seguidores de Paulo Coelho, que não segue o mesmo tanto. Os intelectuais podem até torcer o nariz para essa ciranda, mas, querendo ou não, a literatura invadiu a rede social Twitter (que dispensa apresentações) e tem levantado polêmicas. Se, por um lado, a nova febre traz enxurradas de textos de 140 caracteres que não dizem nada, por outro, os poemas, textos literários, críticas culturais e até mesmo a criação de uma obra coletiva têm feito barulho na rede. E como um elefante incomoda muita gente, surgem as questões em relação à potencialidade do novo fenômeno: que tipo de leitura, leitores e escritores estão sendo criados? Será a hora de dar adeus aos livros, jornais e saraus?

Os brasileiros já invadiram e apostaram nessa rede social. O país, que ocupa a segunda posição em número de usuários no mundo, responde por 8,8% do mercado da rede, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Num emaranhado de informações, que este ano ganha ainda mais força com o tom de eleição na rede, há espaço para postar acontecimentos do cotidiano ou então divulgar notícias, eventos, pensamentos reflexivos. De leitores, os brasileiros passaram a ser escritores, críticos de arte e até mesmo poetas. Já narram histórias, piadas e poesias. Há até mesmo autores que resolveram transportar suas obras à limitada linguagem dessa ferramenta.

Basta navegar na nova onda para ver que a literatura é a bola da vez. Tanto que muitos tuiteiros estão se movimentando para participar de um projeto literário bem ousado: a publicação do romance Dom Quixote, do escritor espanhol Miguel Cervantes, na íntegra, no microblog. A proposta, intitulada Twijote, é do designer espanhol Pablo Lopez, e deve durar um ano para ser concluída. Serão necessários nada menos do que 8,2 mil tweets para publicação da obra. Outro sinal de que o espaço tem deixado de ser banal, como muitos apostaram que seria, é a presença de escritores. Paulo Coelho, de 61 anos, por exemplo, figura na lista dos 200 perfis do Twitter mais influentes do mundo: são nada menos do 289 mil seguidores.

QUEM INDICA? Na tentativa de debater toda essa avalanche que tem causado impacto, o 2º Encontro de Twitteiros Culturais de Belo Horizonte (ETC-BH) trouxe a discussão à tona. Com uma platéia presencial de pouco mais de 20 pessoas – número que segundo a coordenação do evento foi superado por internautas que estavam conectados durante o debate -, o encontro, realizado no câmpus Diamantina do UNI-BH, na Lagoinha, contou com a participação de “conhecedores” do assunto.

Eles, otimistas com a potencialidade que vem sendo descoberta no Twitter, ressaltaram uma delas: a indicação de eventos culturais. Na prática, funciona como aquele amigo que indica algo para outro. Nessa relação, os tuiteiros, ainda que limitados aos 140 caracteres, fazem críticas de filmes, livros, peças teatrais e tantas outras manifestações culturais. “Prefiro a indicação de um bom filme de alguém que sigo no Twitter à sinopse no papel”, garante Júlia Ramalho, coordenadora do ETC-BH. De acordo com ela, é a credibilidade da máxima de “seguir os bons” que faz com que um texto de poucas palavras a convença.

Se “o quem indica” é visto com bons olhos na nova ferramenta, as produções literárias não vão pelo mesmo caminho. As obras coletivas podem não estar agradando tanto quanto parece. A questão da leitura não linear na página do Twitter é ponto negativo para a tuiteira e jornalista Raquel Camargo, de 23 anos. (leia entrevista) . “Esse é o desafio. Uma narrativa em que não há uma organização, o leitor se sente perdido, uma vez que as mensagens são postadas de forma decrescente. Talvez poderia ter um mediador ou um aplicativo para ‘organizar’ as ideias” , defende. Para completar o raciocínio de Raquel, o professor universitário e especialista em redes digitais, Alan Alencar levanta a dúvida: “Se há um livro, por exemplo, que está sendo criado no Twitter por milhares de usuários, no final quem será o autor para a editora que queira publicar o texto? Quem ganhará dinheiro com isso?”

Desafios não faltam, pelo contrário, sobram quando o assunto é a nova febre. Outra questão que levanta polêmica não só no meio, como também para os educadores e uma geração mais antiga, é o medo da leitura ter mudado na tela e, possivelmente, com a pouca quantidade de texto. “Ler é um hábito e tudo aquilo que atribuímos sentido. A todo momento estamos lendo. Não deixamos de praticar isso, o fato é que estamos escrevendo mais, com e-mails, blogs, Twitter. O livro, os jornais e nem os saraus vão sair de cena”, garante o mestre em Linguística do UNI-BH, Wagner Carvalho.

De acordo com ele, a nova febre não tira os leitores de seus livros, inclusive tem o potencial certeiro para convidar para a leitura. “São postados por tuiteiros as indicações de obras, trechos de poemas que instigam a curiosidade de quem está recebendo.” A solução em busca de problemas, como é definido por aí essa ferramenta, lança dúvidas, desafios e discussões. No próximo ETC, por exemplo, o Twitter será debatido na educação, como forma de aprendizado nas escolas. O encontro será no dia 24 de abril.


Fonte: Estado de Minas

Entrevista com Raquel Camargo

2 comentários :

Anônimo disse...

Os Tuiteiros Culturais são um anti-movimento. Que vai se desintegrar no próximo momento

Anônimo disse...

Raquel Camargo... sou capaz de recitar um parnaso de além túmulo para te conquistar. Quero você no meu leito, balbuciando coisas loucas em até 140 fonemas. Linda.